A Diáspora Africana e as Sombras do Norte
A Diáspora Africana e as Sombras do Norte
Hoje percorrendo alguns pontos da cidade de São Paulo, fui tomada por um sentimento de coletividade. É isto, sou parte de um coletivo a caminhar, multidão diversa. Muitos de nós, vieram do mesmo ventre, do mesmo útero, da África mãe. Caminhamos pelo mundo afora. Voamos como pássaros dispersos empurrados pelos ventos. Ficou para trás o ventre, ao qual estamos umbilicalmente ligados.
Diáspora negra africana na paulicéia desvairada, acolhedora, muitas vezes excludente, luta diária. Podemos não nos reconhecer de imediato, mas às vezes sinto que isto ocorre, num vago passar de olhares que se encontram.
No esperançar da vida, aposto no reconhecimento da ancestralidade que nos unirá. Filhos e filhas do mesmo chão, de lugares diferentes de um continente.
Caminhantes de histórias geracionais comuns. Parte de nós, hoje, já não é o que foram nossos antepassados. Muitos de nós, já não arrumamos quartos, camas e mesas para outros, já não somos responsáveis por banheiros limpos, alimentos a preparar, cargas a carregar, terras a lavrar. O que nossos antepassados fizeram, com muita dignidade e que nos trouxe até aqui.
Muitos dirão, passou aquele tempo. Eu porém, digo que não, por dois motivos.
Primeiro porque a maioria dos afrodescendentes ainda se ocupam das funções de serviços e salários precários. Segundo porque reconhecer nosso berço aqui e agora, nos levará a reparação necessária, a superação de um feroz passado que nos foi imposto.
E hoje, mais do que nunca. Isto porque é possível antever tempos sombrios, de trevas que se aproximam, vindas do Norte da América, buscando reacender o cruel passado de servidão para muitos, do apartamento de seres humanos entre “superiores” e” inferiores”, entre “nacionais e imigrantes”, entre “refugiados e cidadãos de um país”.
Em meio à multidão diversa, com descendentes de várias etnias, esperançosa que sou, sonho com um gigante aquilombamento, quase distópico. Vejo sinais, pistas de consciência chegando, no forjar da clarividência e luta diária. Esperançar ativista, como deve ser.
O reconhecimento de ancestralidade na diáspora africana da paulicéia desvairada, de muito nos servirá. Não só para o resgate e reparação de erros históricos do passado, mas para impedir que os ventos fortes do Norte tragam nuvens pesadas e sombrias. Que se transformem em apenas nuvens passageiras, que não nos impeçam de caminhar no ciclo histórico, recuperando nossa condição de humanidade.
Comentários
Postar um comentário